Efeito oculto da creatina no cérebro intriga cientistas

Estudo foca nos impactos da creatina, conhecida por seu uso no esporte, sobre o funcionamento cerebral

28/05/2025 21:02

O organismo produz creatina em pequenas quantidades, e ela também é obtida por meio da alimentação
O organismo produz creatina em pequenas quantidades, e ela também é obtida por meio da alimentação - iStock/ Farion_O

Popular entre praticantes de atividades físicas por seu papel no ganho de massa muscular e na melhora da performance, a creatina vem ganhando espaço também em outro território: o da saúde cerebral. Uma pesquisa recente revelou que esse suplemento, amplamente utilizado no meio esportivo, pode oferecer benefícios cognitivos, especialmente em situações de estresse, como a privação de sono.

O que diz o estudo?

Publicado na revista científica Scientific Reports, o estudo investigou como altas doses de creatina podem impactar o funcionamento do cérebro em condições adversas. Os pesquisadores reuniram 15 voluntários, que passaram uma noite inteira em claro enquanto realizavam uma série de testes cognitivos projetados para medir atenção, memória, velocidade de raciocínio e capacidade de tomar decisões.

Os resultados surpreenderam: os participantes que consumiram creatina antes dos testes apresentaram uma melhora significativa no desempenho mental, mesmo sem ter dormido. O pico dos efeitos foi observado aproximadamente quatro horas após a ingestão do suplemento, e os benefícios se mantiveram por cerca de nove horas.

Essa descoberta sugere que a creatina pode atuar como uma espécie de combustível emergencial para o cérebro, ajudando a compensar parte dos prejuízos causados pela falta de descanso.

Como a creatina age no cérebro?

Naturalmente, o organismo produz creatina em pequenas quantidades, e ela também é obtida por meio da alimentação — principalmente de carnes e peixes — ou suplementação. A maior parte dessa substância é armazenada nos músculos, onde atua na produção rápida de energia durante esforços de alta intensidade e curta duração.

No entanto, uma fração da creatina também é transportada e armazenada no cérebro. Em situações normais, essa quantidade é suficiente para contribuir discretamente no metabolismo cerebral. Porém, quando o corpo entra em estado de estresse — como na privação de sono —, o cérebro parece aumentar sua demanda por creatina para manter o funcionamento adequado.

Isso acontece porque a creatina auxilia na produção de ATP (trifosfato de adenosina), a principal molécula de energia utilizada pelas células. Sem sono, o cérebro precisa trabalhar mais para manter funções básicas, como concentração, memória e raciocínio lógico. A suplementação, portanto, oferece um reforço energético temporário para essas funções.

Outros benefícios da creatina

Além de seus efeitos bem documentados na performance esportiva e na recuperação muscular, a creatina tem sido associada a uma série de outros benefícios à saúde, incluindo:

  • Aumento da massa muscular e melhora na força física;
  • Aceleração na recuperação muscular após treinos intensos;
  • Melhora da densidade óssea, o que pode ajudar na prevenção da osteoporose;
  • Benefícios cardiovasculares e metabólicos, ajudando na regulação de glicose e na saúde do coração;
  • Potencial neuroprotetor, com estudos preliminares investigando seu papel na prevenção de doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson.
  • Possíveis efeitos colaterais e riscos

Embora considerada segura para a maioria das pessoas quando utilizada nas doses recomendadas, a creatina não está isenta de possíveis efeitos colaterais, especialmente quando consumida em excesso. Entre os mais comuns estão:

  • Desconforto gastrointestinal, incluindo náuseas, diarreia e cólicas;
  • Inchaço, retenção de líquidos e cãibras musculares;
  • Potencial sobrecarga dos rins e do fígado, particularmente em pessoas que já apresentam predisposição ou condições pré-existentes.

Por isso, especialistas alertam que a creatina não deve ser utilizada indiscriminadamente. A automedicação, especialmente com doses elevadas, pode trazer riscos à saúde.

O que dizem os especialistas?

Ali Gordjinejad, autor principal do estudo, destaca que a creatina poderia se tornar uma alternativa interessante ao café e outros estimulantes para quem precisa manter o desempenho cognitivo durante longos períodos sem dormir. No entanto, ele faz um alerta: os resultados, embora promissores, são preliminares. Mais pesquisas são necessárias para compreender plenamente os efeitos da creatina no cérebro, sua segurança em longo prazo e quais seriam as doses ideais para esse tipo de uso.

“Nosso estudo abre uma porta para um novo campo de pesquisa, mas não é um sinal verde para que as pessoas comecem a consumir altas doses de creatina para substituir o sono. O descanso continua sendo insubstituível para a saúde mental e física”, afirma o pesquisador.

Publicado na revista científica Scientific Reports, o estudo investigou como altas doses de creatina podem impactar o funcionamento do cérebro em condições adversas
Publicado na revista científica Scientific Reports, o estudo investigou como altas doses de creatina podem impactar o funcionamento do cérebro em condições adversas - iStock/ Djavan Rodriguez

A creatina deve fazer parte da sua rotina?

Para quem pratica atividades físicas regularmente, a creatina já é um dos suplementos mais recomendados, devido à sua eficácia comprovada e boa margem de segurança. No entanto, quem está interessado nos potenciais benefícios cognitivos deve procurar acompanhamento médico ou de um nutricionista especializado, que poderá avaliar as necessidades individuais e orientar sobre dosagem e possíveis interações.

O que este estudo reforça é que a creatina vai muito além do universo fitness. Trata-se de uma substância com potencial multifuncional, que pode beneficiar tanto o corpo quanto a mente — sempre, é claro, utilizada com responsabilidade e orientação adequada.